Prever tendências para o universo casamenteiro nos próximos meses, certamente, não é tarefa fácil. Neste momento, vivemos dois sentimentos conflitantes: esperança, pelos índices de vacinação aumentando (ainda que lentamente) no País e exemplos de aparente “vida normal” nos Estados Unidos e Europa, mas também medo de novas variantes e novas ondas da Covid-19. Tudo isso faz com que o cenário para o mercado de festas ainda seja muito incerto. O que se pode afirmar é que essas duas realidades opostas também se refletem no perfil dos casamentos do próximo ano.
Ao que tudo indica, os eventos mais intimistas e exclusivos, com lista reduzidíssima e atenção aos detalhes vieram para ficar. “A pandemia ressignificou muitas coisas, inclusive a importância de celebrar, principalmente com os mais próximos”, explica Camila Piccini, fundadora e CEO dos sites Say I Do e Casar.com.
No entanto, a demanda reprimida por confraternizações tem feito muitos noivos investirem em megaproduções para os próximos meses. “Muita gente está buscando espaços cada vez maiores, ao ar livre, para juntar 400, 500 pessoas... E as listas de confirmação estão apontando baixíssima ‘quebra’. Ou seja: os convidados devem comparecer em peso, já que estão ansiosos para curtir um festão”, conta Luciano Martins, sócio-diretor da Casa Petra e do estúdio de cenografia para eventos 1-18 Project.
Fruto dos novos tempos, os testes de detecção de Covid-19 viraram item indispensável em qualquer festa. “A demanda disparou! Agora, na porta do evento, fazemos o teste de antígeno [proteína] viral, com swab nasal, que tem resultado em 10 minutos e 98% e eficácia”, explica Claudia Serpa, sócia-fundadora do iGroup Care, marca de laboratórios, clínicas e ambulatórios médicos em empresas que, agora, tem seu faturamento composto 70% por esse serviço em eventos. Os custos variam de R$ 90 a R$ 200 por teste. E quando a pessoa é barrada, deve voltar para a casa – mas não sem antes levar um kit com docinhos e bem-casados.
Infelizmente, porém, é impossível garantir uma festa 100% livre de coronavírus, uma vez que os testes podem acusar falso negativo, caso a pessoa tenha se infectado menos de 72 horas antes.
Por isso, os eventos têm seguido os protocolos de segurança dos restaurantes: uso obrigatório de máscaras de proteção para staff e convidados (que só retiram o acessório na mesa, ao comer e beber), distanciamento de 1,5m entre as mesas, uso de luvas plásticas para tocar nos talheres do bufê, álcool gel espalhados pelo ambiente e ausência de pista de dança. “Muitas noivas têm escolhido o serviço à francesa. Mas quando há bufê, os convidados são servidos por uma copeira. Também escalamos copeiras para fiscalizar a mesa de doces e servir os quitutes em pratinhos”, explica Elisa Tavares Bueno, sócia da assessoria de eventos Boutique de 3.
Mas não pense que eventos menores são mais fáceis de organizar, viu? “Os detalhes aparecem muito mais – assim como as pequenas falhas. Tudo tem de estar impecável. Recentemente, fui a três lojas de aluguel de louça escolher os itens da mesa de almoço. Isso seria impensável num casamento para 300 pessoas”, diz Elisa.
O cerimonialista carioca Roberto Cohen pontua ainda que os microweddings não representam budgets menores. “Os custos por convidado na verdade aumentam, porque a noiva gasta a mesma coisa com serviços como assessoria, música, vestido, foto e filmagem, maquiagem...”
O religioso está diferente
Lembra aquelas decorações cinematográficas nas igrejas, com tapetes quilométricos, chão espelhado, centenas de velas e muitas flores? Pois as restrições de distanciamento social nos templos religiosos têm feito as noivas repensarem a cerimônia. Algumas estão optando por convidar, no máximo, 30 pessoas para a igreja e, depois, fazer um almoço. Nesse caso, o minimalismo acompanha a decoração da nave e do altar, valorizando a beleza da arquitetura sacra.
“Celebrei minhas bodas de dez anos na [igreja] Nossa Senhora do Brasil [em São Paulo], com cerca de 20 convidados. O lugar estava vazio, sem decoração, a não ser umas flores que levei para a mesa do altar”, lembra Camila Piccini. “Nunca imaginei que a igreja fosse tão linda! Dá vontade de dizer para as noivas: ‘Não cubram mais o corredor com tapete!’”
Estilo europeu estica as festas
A saudade de celebrar e a tendência de eventos menores tem feito crescer as festas com longos almoços, que duram o dia todo. “São casamentos para 30 a 60 pessoas, que contam com cerimônia, 1h30 de coquetel, um longo almoço-degustação à francesa, com entradas, pratos principais, sobremesas, café... Só então abre-se a pista open bar, que costuma ser bem animada”, explica Marina Maciel, cerimonialista de Petrópolis. “Esse é um modelo bem comum na Europa, que está se popularizando por aqui. O bom é que é possível conversar e matar a saudade de todos e, só depois, dançar”, diz.
Nesse caso, a economia feita com o corte na lista de convidados pode ser bem utilizada para pagar a hora extra dos fornecedores, em festas que chegam a durar 12 horas – o dobro do que costuma ser praxe no mercado.
Já conhece o “first look”?
Funciona assim: uma hora antes da cerimônia, os noivos se encontram para um momento só deles – e, claro, das fotos. O noivo fica de costas e, quando a noiva chega... tcharam!
“É muito emocionante, porque eles ficam mais à vontade, podem se falar sem aquela tensão de ter todo mundo olhando. Outra vantagem é que eles fazem um ensaio no local do evento ainda vazio, com a decoração pronta. E acabam ganhando mais tempo de festa, uma vez que o ritual das fotos já foi cumprido”, explica Marina Maciel, que garante ainda sobrar muita emoção para o momento da chegada da noiva à cerimônia.
Consciência é hit!
Segundo o The Green Bride Guide e a plataforma Lápis de Noiva, um casamento produz cerca de 182 kg de lixo, o que significam 182 mil toneladas, se considerarmos a estimativa de mais de 1 milhão de casamentos realizados por ano no Brasil. Além disso, o evento emite 58 toneladas de CO2, equivalente ao que cinco pessoas produzem em um ano.
Pensando nisso, Marina Maciel lançou, em maio, o projeto colaborativo @casarconsciente, plataforma que reúne fornecedores com as melhores práticas. “Nosso lema é que o evento seja ecologicamente correto, socialmente justo e financeiramente viável. Isso pode ser feito com ações simples, como optar por festas à luz do dia e flores plantadas, trabalhar com fornecedores locais e exigir o descarte correto de lixo e óleo de cozinha, até ações com maior impacto, como fazer a compensação de carbono.”
Para Roberto Cohen, embaixador do projeto, não se trata de modinha passageira. “Essa é a nova essência dos casais modernos. O momento atual nos trouxe muitas reflexões”, afirma.
A era dos convites 5.0
Vegana e ligada em sustentabilidade, Sasha Meneghel – que se casou em maio com o cantor gospel João Figueiredo – foi muito clara em seu pedido: “Quero um convite sustentável, reaproveitável e vegano.” Bruno Anacleto, diretor de arte da Personalisee, iniciou então sua pesquisa e encontrou uma infinidade de materiais e cores. O resultado? Um convite 100% algodão com texto impresso à base de água, capa de folha de bananeira branqueada e tingida com corante natural azul e envelope de papel-semente de Camomila, lacrado com cera quente.
“Ela realmente influenciou o mercado. Agora, de cada dez pedidos que recebemos, oito são para opções sustentáveis”, revela Anacleto.
Outra tendência forte são os save the dates que também trazem informações sobre os protocolos de segurança da festa. “As pessoas querem saber se vai ter teste de Covid na porta, se devem levar comprovante de vacina, como vai funcionar o evento...”, afirma Juliana Zupardo, sócia-fundadora da Just 360, empresa especializada em convites eletrônicos e sites de casamento. Segundo ela, o RSVP por telefone está em desuso. “Agora, preparamos formulários simples, que são enviados por WhatsApp. Ali, é possível saber o tamanho dos chinelos, se o convidado tem alguma intolerância alimentar, se vai precisar de hotel e transfer em Destination Weddings, entre outras coisas importantes.”
Dieta vegana diversifica o bufês
Entre os itens do casamento da Sasha que viralizaram nas redes está o bufê 100% vegano, para 18 convidados, organizado pelo Buffet Zest. “Hoje, 80% dos eventos que fechamos têm demanda para pratos veganos e vegetarianos. E os convidados onívoros costumam quebrar preconceitos e sair com outra percepção sobre a dieta vegan”, diz Dani Kishimoto, sócia-diretora do Buffet Zest.
Casamentos mais intimistas e sem pista de dança transformam o bufê no acontecimento da festa. Assim, uma dinâmica interessante é criar o bufê da noiva e, em outro ponto do salão, o bufê do noivo. “Muitas vezes, a noiva é vegana e o noivo, carnívoro. Aí, num lado da festa, montamos o menu que ela escolheu e, no outro lado, o menu dele. O legal é que os convidados acabam conhecendo mais os gostos dos noivos”, afirma Dani.
Doces com mais saúde e menos excessos
A mesa de doces também está mais diversa, com opções para quem restrições alimentares. “Os pedidos aumentaram muito! Todos os nossos doces são livres de glúten e lactose, e temos itens low carb, veganos, sem refinados... Mas a linha mais procurada é a sem açúcar”, conta a chef pâtisserie Isabela Akkari, que batiza a marca paulistana especialista em confeitaria saudável.
Já no quesito bolos, a ordem é eliminar os excessos. “Menos isopores, mais verdade, mais realidade. Os bolos podem ser mais baixos ou altos, mas definitivamente nada exagerado”, diz a confeiteira Isabella Suplicy.
Segundo Carol Melo, fundadora da Carol Melo Doces, trios de bolos menores também estão em alta, principalmente com acabamento espatulado de buttercream, o creme-manteiga, muito utilizado para cobertura de bolos fora do Brasil. É um acabamento mais rústico, que combina bastante com festas ao ar livre, em praias, fazendas, restaurantes...”, diz ela.
O bar ficou mais premium
A diminuição do número de convidados impactou positivamente na qualidade dos destilados, tornando o bar um elemento fundamental para compor as novas experiências exclusivas dos eventos. “A carta de bebidas superpremium passou a ser considerada. Tem crescido a presença de drinques com bourbon, scotchs e uísques japoneses. Além disso, podemos ter três opções premium de gin para que o convidado escolha o que mais o agrada”, conta Herbie Ramos, diretor do Help!bar.
Além disso, dois tipos de bares estão sendo montados: o bar da pista tem bebidas refrescantes, de fácil execução, como gin tônica, highball, moscow mule... E num lugar mais afastado, o bar de coquetelaria traz os clássicos drinques de hotel. “As receitas inovadoras demais estão em baixa, porque numa festa as pessoas buscam aquilo que elas reconhecem. É aí que a coquetelaria clássica reina”, explica Herbie.
Ah, e esqueça aqueles bares decorados com as frutas da caipirinha. Todos os ingredientes estão sendo guardados em potes fechados, ou embaladas individualmente. Outra mudança é que o tamanho do bar: maior, para que haja distanciamento entre os bardenters.
Amenities do “novo normal”
“Se antes, a moda eram as garrafinhas de água e chinelos personalizados, agora, a tendência nos casamentos é contar com frascos de álcool gel, kits com máscara + saquinho porta-máscara feitos de tecido, ou envelopes guarda-máscara com os protocolos de segurança impressos no verso”, diz Karina Kirk, da The Wedding Art, marca que elabora a identidade visual dos eventos.
Outra forte onda é a das experiências olfativas. “Depois de tantos eventos via Zoom, o pessoal quer explorar todos os sentidos nos eventos presenciais”, explica Anacleto. “Assim, é possível mandar para ter um convite perfumado com uma essência personalizada, levar essa essência para a festa e, ao final, presentear os convidados com uma vela que contenha a essência.”
Decoração minimalista
“Exagero é cringe”, brinca Luciano Martins, da Casa Petra e 1-18 Project, lembrando a gíria da Geração Z para “vergonha alheia”. “Agora, a procura é muito mais para propor experiências aos convidados, do que uma decoração-ostentação. As pessoas estão investindo em projeções com superestrutura de shows, em contratar cantores ou DJs conhecidos...”, explica Martins.
Cenógrafo e designer de ambientes e eventos, Luis Fronterotta estava acostumado a criar projetos nababescos antes da pandemia. Na pandemia, porém, tem feito batizados, aniversários, bodas e casamentos para um público que, às vezes, chega a apenas dez pessoas. “O processo criativo teve de se adaptar. E digo mais: projetos de festas menores dão o mesmo trabalho do que de uma festa grande.”
Para ele, leveza é a palavra que vai balizar a decoração dos próximos casamentos, com predominância de tons pastel, terrosos claros, beges e cinzas, madeiras claras, palha, linho, vidros, espelhos ou painéis vazados (no lugar daqueles chapados, repletos de flores). “Nove em cada dez noivas estão buscando espaços ao ar livre. Tudo o que remeta à vida na natureza está em alta: arranjos mais orgânicos e menos arrumadinhos, flores pelo chão, folhagens de cores mais neutras, acinzentadas, com toques de cores mais vibrantes”, explica o cenógrafo. Sinal dos novos tempos.